quarta-feira, março 31, 2004

Eu conto

A concelho de uma alta autoridade gastronómica fui há tempos fazer uma visita a um restaurante açoreano de nomeada. O empregado, simpático e muito diligente sugeriu o menu do dia por ser mais económico e conter uma variedade de ingredientes sugestivos e díficeis de combinar nos tempos mais próximos. Como gosto de experimentar coisas novas resolvi acatar a sugestão e banquetear-me com o COMBINADO AÇOREANO.
Bom. A história poderia acabar aqui sugerindo aos leitores a suposta cozinha afamada deste restaurante. Mas infelizmente as coisas correram mal. Passo a descrever.
O combinado era composto por uma paella valenciana com aspecto apetitoso, um hamburger tipo McDonald´s mas mais pequeno, um bife bem espesso e um cherne grelhado de tamanho médio. Para beber, chá preto e coca-cola à descrição. Estranhei a combinação destes pratos mas por vezes a mistura de sabores e de consistência revela agradáveis surpresas e atirei-me de alma e coração ao repasto.
E então começou o pesadelo. A paella não tinha qualquer sabor, e para cúmulo encontrei no arroz dois pelos que me pareceram ser do bigode do cozinheiro. O hamburger estava em sangue e trazia uma etiqueta de plástico duro que dizia “made in Texas” que só dei por isso quando a trinquei por engano, o que me valeu a perda de metade de um dos dentes da frente. O bife estava cozido sem sal e a consistência era levemente espongiforme. O cherne estava salgado e sabia a fénico, e o molho que o acompanhava sabia a comida chinesa fora de prazo. O chá parecia água de lavar a loiça, e o que me valeu foi regar tudo isto com a coca-cola, que pelo menos era doce.
Paguei a conta e regressei a casa nada satisfeito com uma sensação de azia, tonturas, e uma dor de dentes aguda. É claro que a meio da noite tive de ir a correr para a casa banho, mas cheguei um pouco atrasado e o corredor ficou atulhado de merda liquefeita e um vomitado escuro onde se distinguiam ainda restos de carne em decomposição, arroz moído e peixe podre. Mas não calculam o cheiro que tudo isto deitava. Nem a brigada de desinfecção conseguiu dar conta dele!
Do mal o menos: estou livre do cheiro que ficou para sempre lá em casa. Estou internado na ala mais segura do Hospital Júlio de Matos onde uma dúzia de médicos observam a evolução da doença das vacas loucas num ser humano. E uma coisa aprendi: combinados nunca mais! Prefiro enlouquecer devagar.