Ordem para matar o Serviço Nacional de Saúde? Uma década atrás o SNS inglês era apontado como exemplo a seguir por todo o mundo. Thatcher e outros liquidaram-no. Os índices de qualidade na prestação de cuidados de saúde caíram a pique. Este fenómeno parece estar a contagiar o nosso país com a complacência, para não ser mais agressivo, dos nossos dirigentes políticos. As clínicas privadas - e que fique claro que é um direito que têm - proliferam. Arrastam os melhores profissionais formados nos hospitais públicos. Também é compreensível. Melhores instalações, melhores salários, muitas vezes incentivos a sério e pondo os médicos a fazer o que gostam. Tratar os doentes e não horas a fio em reuniões improdutivas e afogados em papelada.
Os profissionais que abandonam o sector público são sempre os melhores. Custaram milhares e milhares de euros ao estado. Saem a custo zero. Deixam autênticas lacunas de competência que poderão levar dezenas de anos a preencher! Saem em especial os especialistas de áreas fundamentais. Cirurgias, medicina interna, imagiologia, otorrinolaringologia, cardiologia de intervenção, intensivistas, etc.
...O país tem a honra de ter como responsável pela erradicação da tuberculose no mundo o presidente Jorge Sampaio (quis o destino que seja o filho do senhor que criou em Portugal um dos programas nacionais de vacinação mais efecazes do mundo). O facto é que de repente me chegam algumas mães ao consultório com os pequeninos sem a vacina do BCG. Dizem-me que no centro de saúde ou no hospital onde as crianças nasceram lhes foi dito para aguardar. Não havia vacina!.....Em 8 de Fevereiro de 2006 a Circular Informativa da DGS nº 5/DT dá orientações técnicas para a vacinação contra a doença invasiva vulgo designada por vacina da meningite pneumocócica. Esta vacina está no mercado há cerca de sete anos. É muito eficaz. É cara. Cada dose custa cerca de um sexto do salário mínimo nacional proposto para 2008. São necessárias quatro doses para a criança ficar devidamente vacinada. Má notícia. Ainda nem sequer é comparticipada.
Depois de algum tempo, mais vale tarde do que nunca, o primeiro-ministro anunciou na AR que a vacina contra o cancro do colo do útero iria entrar para o Programa Nacional de Vacinação. Execelente notícia. Será lá para Setembro de 2008 ! Por que razão? O papilomavírus irá de férias?
...Com a legítima abertura de clínicas privadas com serviços de obstetrícia e neonatologia os poucos profissionais dos serviços públicos estão a ir embora. No privado dão-lhes melhores condições de trabalho (o Estado há muito congela carreiras e salários). Já são poucos os que trabalham no sector público. Estão em grande parte envelhecidos e uma boa parte completamente frustrados. Má notícia! O futuro de um sector de êxito criado, é bom lembrar, por Leonor Beleza, pode entrar em ruptura. A percentagem dos portugueses que podem recorrer aos serviços privados ainda só anda à volta dos dez por cento. Fazem ideia de quanto custa tratar em condições dignas um pequenino prematuro de mil gramas? Varia conforme as patologias. Mas nunca menos de vinte a 25 mil euros, por dois meses de internamento!...
O anterior foi publicado no suplemento Notícias Magazine de 30 Dez. 2007 pelo médico pediatra Octávio Cunha com o sugestivo título 2007: Ordem Para Matar.
Acrescento eu que assistimos à destruição vertiginosa do que levou anos a erguer, um Serviço Nacional de Saúde que, pese embora muitas lacunas e erros corrígiveis, poderia tender para melhor tratar da saúde aos portugueses numa perspectiva de serviço público fundamental.
São hospitais a fechar, serviços de urgências médicas que encerram, centros de atendimento público que terminam, serviços de especialidades que são tranferidos com o seu inevitável desmantelamento nos locais existentes. E muito destes até com as melhores referências e recentemente instalados ou remodelados.
Será que os interesses privados, económicos e não só, são razão suficiente para fechar unidades de cuidados médicos em qualquer parte do mundo? Será que o encerramento de serviços de utilidade pública no âmbito dos cuidados de saúde é admissível apenas por uma simples conta de somar e subtrair euros, e mesmo assim mais do que duvidosa?
Pois cá para mim, nem que um serviço, hospital ou centro passe a maior parte do ano às moscas não chega sequer para justificar uma redução nos rolos de gaze, quanto mais o seu fecho. A isto chamo com todas as letras: Vergonhoso! E a quem toma tais decisões, apelido textualmente de A.P.M. (Assassinos Profissionais Mercenários).
Mas tudo isto também tem a ver com a recente entrada em vigôr da lei do fumo.
Se é de louvar qualquer iniciativa que possa contribuir para a diminuição de hábitos tabagistas, já é de repudiar qualquer iniciativa que se imponha pela proibição por lei. De proibição em proibição se chegará rápidamente ao é proibido viver excepto se de acordo com os elevados valores de alguns senhores do mundo.
Mas no estado actual do mundo, ou de grande parte dele, o império amerdicano (mais uma vez) tem a iniciativa, continuando a sacrossanta cruzada em nome do bem sacrificando os maus definidos por parâmetros de fundamentalismos e muitos outros ismos! Primeiro exporta e fomenta o vício, para daí retirar enormes proveitos económicos, para depois os expurgar sem que se auto-retrate de mea culpa. Lá por em Nova Iorque já de há tempos ser proibido fumar, segundo consta, o que é que eu tenho a ver com isso ao ponto de aqui ser tratado de forma idêntica? Não é por alguns quererem ser animais irracionais que eu também o queira ser. Ainda por cima vindo o exemplo desses tais amerdicanos que são os responsáveis por, entre muitas outras coisas terríveis da actualidade, 59 % das armas destinadas a países da América Latina, 46% a países do Norte de África e Médio Oriente e 40% aos países da Ásia Pacífico, sendo mesmo os maiores exportadores de armamento a quem cabe uma fatia de um terço das armas existentes fora dos EUA, e isto segundo dados de 2002, imagine-se hoje! E são esses que se arvoram em garantes da felicidade humana? Ou antes devem ser apelidados dos garantes da miséria humana?
Mas, mesmo supondo que a lei agora em vigôr não foi consequência desse exemplo amerdicano levado à prática, seria menos incorrecto as autoridades políticas deste país planearem as normas e campanhas que, sem prejuizo de ninguém e muito menos de uma forma proibitiva, levasse a uma redução aceitável dos hábitos de consumo tabagista. Por exemplo, o aumento dos custos, a diminuição gradual dos postos de venda, a par da obrigatoriedade de serem respeitados todos os cidadãos, quer fumadores quer não. Para isso bastava regular no sentido de impôr normas de funcionamento de espaços públicos onde as liberdades de cada um fossem respeitadas, atendendo às diversas funcionalidades e locais. Alguém deixou de aplaudir as medidas de não ser permitido fumar nos transportes públicos ou nos hospitais ou em espaços fechados para a prática desportiva? Não, apenas porque é do senso comum e todos compreendem a necessidade da medida por falta de alternativa possível e real, embora para transportes de longo curso devesse ser criado obrigatóriamente espaços com as condições adequadas para os tais agarrados ao fumo. Veja-se o caso do transporte aéreo, onde seria muito fácil a criação de tais áreas restrictas, mas suponho que já todos sabem quanto encaixam as companhias aéreas apenas por não serem obrigadas a gastar uns tostões a mais em cada viagem com o combustível necessário ao funcionamento dos aparelhos destinado a esse fim.
Agora, das 24 horas de 2007 para as zero de 2008, passar a impôr a proibição de fumar na tasca do Ti Manel das Berças onde o seu primo e compadre todos os dias vai beber o seu copito e dar umas cigarradas, não faz sentido a não ser que se pretenda desenvolver conflitos inultrapassáveis. E a lei, tanto quanto eu saiba num estado dito de direito, é de aplicação cega e universal. Já para não falar no nível dos funcionários que vão fiscalizar o seu cumprimento, que quanto a mim e pelos resultados recentemente observados, se encontram ao nível de uma cave.
Compreende-se que em serviços públicos, por um critério até de exemplo, tal inibição de fumegar seja aceitável, embora a custo reduzido e sempre que possível, com a criação de espaços restritos para os agarrados ao vício do tabaco. Compreende-se que em ambientes de serviços de refeições de dimensões maiores ou outros de características similares, ou espaços comerciais de grandes dimensões tipo centros comerciais, onde os não fumadores são obrigados a levar com o fumo dos outros nas suas andanças do dia a dia, deveria impôr-se a criação de áreas para fumadores, só que aqui seria muito mais inteligente definir regras para os estabelecimentos já em funcionamento, no tipo de haver um período confortável para que os seus donos pudessem planear os custos que necessáriamente as alterações obrigam para a criação de espaços para fumadores, sendo que até lá a decisão seria da inteira responsabilidade dos seus donos, funcionando aqui a lei da oferta como garante da decisão mais acertada. Para os novos estabelecimento do género a abrir, então sim, deveria ser dada prioridade de autorização de funcionamento aos que, à partida, tivessem tais espaços devidamente acautelados, sendo que o prazo para todos os que já têm processos em curso fosse mais apertado. Para os tipos de cafés ou de pequenas tascas, mesmo que com o serviço de comidas, aí a decisão deveria ser apenas dos seus donos. Quem não se sinta bem, não usa.
Já no caso de serviços de pura diversão tipo bares, discotecas, casinos, salas de jogos ( ou até de alterne..), o critério deveria ser muito menos exigente, funcionando a lei da oferta e da procura como garante supremo do êxito. Afinal, só vai a determinado ambiente de diversão quem o quer, quando o quer e da forma que o quer frequentar.
Atente-se, por exemplo, como poderão sobreviver apenas com o negócio que sempre os sustentou, aquele pequeno comerciante que serve umas bicas, ou uns copitos e uns pastéis de bacalhau ou mesmo meia dúzia de refeições diárias ao pessoal trabalhador, se quizer optar por permitir fumadores no seu estabelecimento? Quantos meses de trabalho poderão pagar o projecto, equipamentos e alterações necessárias para instalar um sistema de renovação do ar de acordo com a legislação? Pensem que nunca menos de dez mil euros terá de dispender. Então qual a solução? Obrigatóriamente o não permitir fumar. Agora vejam o caso do tal Ti Manel das Berças, que são aos milhares por este país fora. Das duas três, ou tem a sorte de nunca ser visitado pelos GNRs ou outros inspectores, ou consegue suborná-los devidamente ou apanha tantas multas que só tem um destino, dedicar-se à pesca, e mesmo assim só se tiver comprado a licença respectiva e mesmo assim, só se não for apanhado com mais de meia dúzia de carapaus face à lei que saiu o ano passado. Claro que, nesse momento do campeonato, o desespero para alimentar a família é tão grande que pode optar por dedicar-se ao comércio da droga, pois aí já as mafias o protejem!
E isto apenas para dar algumas ideias de que proibir sem atender a critérios sérios e reais é meio caminho andado para, de hoje para amanhã, também com a história do tal bem comum, vir a ser proibido o consumo de bebidas alcoólicas pelas consequências que o seu uso exagerado pode causar ou o incómodo que é a presença de alguns embriagados, ou a ser proibido o uso de telemóveis pelo ruído incomodativo que estes produzem quando da chegada de uma chamada, ou mesmo até a presença de crianças de tenra idade em locais de uso público, pelo ruído dos seus estridentes gritos, a não ser, claro se com ançaimes! Rídiculo, não é? À pois é! Mas atentem só que, também com o deslavado argumento da saúde pública, é bem recente mais uma proibição: É proibido o uso dos históricos galheteiros em restaurantes. Imaginem quanto ganharam de mão beijada os comerciantes e produtores do vazelhame de vidro, ainda por cima sabendo que estamos a léguas do reciclável!
De proibição em proibição, o admirável mundo novo se vai tornando realidade!
Não me admirarei se, daqui a uns tempos, ainda sou mandado a redescobrir o caminho marítimo para a Índia num barco a remos, como castigo por ter puxado de um cigarro em plena via pública. E nem quero imaginar o que me poderá acontecer se acendesse um puro cubano!
Mas afinal em que ficamos? Por um lado, por razões de saúde pública, aí está a lei do fumo de cigarros, mas por outro, a saúde pública já nada tem a ver com a melhoria dos seus cuidados, fechando-se hospitais e similares. E que dizer das emissões poluentes dos transportes públicos e privados? Só quem não experimentou passear-se pela Baixa lisboeta em hora de ponta é que não imagina as doses de tóxicos que ingere a cada hora, e porque não proibir, com a urgência e determinação que a lei agora saída impõe, a circulação de veiculos poluentes? E isto para ser benévolo, pois também deveriam já ter sido de há muito proibidos os transportes que produzem qualquer tipo de poluição. Só que aqui todos sabemos que, afinal, é sempre o económico que comanda este mundo louco em que eu estou metido.
E afinal, toda esta panóplia de coisas, apenas pode ter uma conclusão: Os responsáveis políticos tudo estão a fazer para TRATAR DA SAÚDE AO PESSOAL !
Digo e reafirmo, tratar da saúde, não tratar da doença!!
Àh é? Saúde para todos? Afinal, o que tu queres sei eu!
Por mim, que até queria deixar de fumar, agora é que vou passar a ser uma chaminé andante. Só cá por coisas!
Consegui chegar ao fim da leitura do texto, o que me deixou com sequelas emocionais difíceis de diagnosticar. Felizmente o SAP da minha zona fechou há 15 dias e assim não tenho de me preocupar com a saúde. Além disso preocupações para quê? Vem aí mais um canal de TV, isso sim é que é importante!
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