Amândio Pina, ex-convidado profissional do HermanSic, ex-guarda-costas de Santana Lopes e Sadam Hussein, ex-recluso em Custóias, ex-grumete em Guantanamo, ex-companheiro de musculação de Schwarzenegger, ex-gay, ex-figurante em filmes porno para trans-sexuais, visitou ontem pela 587ª vez o centro comercial Colombo. No meio da barbárie consumista sentiu pela primeira vez a dor do aguilhão da revolta ferrar-lhe a zona lombar. Berrou, contorceu-se de dores, arranhou e amarinhou pelas paredes. Um carteirista saltou do 2º piso, uma adolescente sufocou com um hamburger, alguém ficou com um telemóvel encravado no cérebro. Ofegante, Amândio Pina julgou estar apenas doente, pois o minúsculo cérebro que possuía não chegava mais longe. Tomou uma aspirina da bayer, mas a aversão que sentia não passou. Pior, agravou-se. Já combatera o comunismo, o terrorismo, o cataclismo, o mongolismo e o antropomorfismo, mais por instinto que por convicção, mas nunca pensara sentir um tal ódio e aversão repentinos ao consumismo. Confuso e baralhado, saiu dali a correr que nem um louco e só parou no seu apartment na Reboleira. Respirou fundo, bebeu um chá de camomila morno, e começou a sentir-se melhor. Amândio sabia que se não agisse de imediato entraria em depressão. Já sucedera antes, aquando da rixa na discoteca Al-Jazeera, e durante o assalto ao infantário A Chupeta Pagã. Passou a mão com carinho pelos diplomas emoldurados que tinha na parede, bacharelato em massacre de indigentes pela universidade de Dodge City, licenciatura em tiros na nuca a hispano-americanos, curso intensivo de extermínio de árabes, turbantes e tipos-assim-pró-escuro pela escola básica Sylvester Stallone, formação teórica em bombismo suicida, mestrado em culinária de combate...
E tomou a decisão que se impunha: enfiou nas calças camufladas o cinto de TNT, guardou no bolso o detonador sem fios oferecido pelo porteiro do Pentágono, pôs ao pescoço o colar com o crucifixo de plástico, herança da sua madrasta, e ali mesmo jurou a pés juntos que iria deixar de fumar. Dali até ao Colombo seriam mais ou menos 30 minutos a pé. Decidiu chamar um táxi.
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No centro comercial, entre o piso 0 e o piso 1, na solidão claustrofóbica do elevador de serviço, Amândio Pina é definitivamente decapitado a um só golpe de espada pelo candidato a samurai Lewis Delgado, lambe-botas estagiário e guarda-elevadores em part-time. Lewis leva o cinto de TNT e o detonador, chama a segurança e o 112, pretende levar o cinto como recordação. Lewis perde algures o detonador.
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Maria Cavaco Silva e mais 283 guarda-costas vai às compras ao Colombo e tropeça no detonador esquecido entre o WC dos deficientes e a loja de roupa feminina El Tampax Rojo.
A curiosidade é mais forte que a prudência, e Maria não resiste a pegar no instrumento.
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Hoje, o Presidente e o seu fiel 1º Ministro vão depositar uma coroa de flores na cratera que substituiu o edifício Colombo após o atentado. Até hoje ninguém sabe onde foi parar a cabeça de Amândio Pina. Quanto a Maria Cavaco Silva sobreviveu apesar de também ninguém saber onde para a sua cabeça. Diz quem sabe que não se nota a diferença.
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