quarta-feira, novembro 17, 2004

Crónicas da Sanita (4)

Já tinha decidido não continuar com estas crónicas, mas tenho a impressão que estou a tomar o gosto pela escrita. Começo a perceber porque há tanta gente importante a escrever livros e que por acaso não são escritores, como o Santana Lopes, o Cavaco, o Mourinho, o Padre Borga, e a julgar pela qualidade demonstrada pela concorrência acho que terei grandes hipóteses de escrever um best-seller. Penso que a experiência da minha vida é muito mais interessante que as fanfarronices do Mourinho, as orações em forma de música pimba do padreca, ou os grandes devaneios sebosos do 1º ministro e a filosofia de cuspo do autoconvencido Cavaco. E estou a pensar em fazer como o Santana, meter os escritos na caixa do correio de cada português. Cá por mim, eu diria que o melhor era o 1º ministro meter os escritos num sítio que eu cá sei, no dele ou de um outro ministro à sua escolha, mas eu entendo esta forma de comunicar com as massas, e o gozo que daria encher as caixas de correio dos portugas com relatos escandalosos da vida intima de gente importante. Mas isso é um cenário que guardo para outra oportunidade.
Acontece que fui contratada para animar um congresso partidário em Barcelos, cujo nome não posso dizer por motivos de segurança. Haviam mais contratadas, mas baldaram-se à última hora vá-se lá saber porquê, uma tal Manuela Leite e uma Leonor Feiosa ou Beleza, para o caso tanto faz. Pois eu fui contratada quase em cima do acontecimento e não tive tempo de preparar o meu número, mas um senhor muito comunicativo que troca os ?r? pelos ?g? e que eu acho que é ministro ou locutor da TV disse que não era preciso, eu só tinha de bater palmas e dar gritinhos quando um senhor com o cabelo empapado em gel estivesse a botar discurso. O senhor com o cabelo empapado já eu conhecia de outros fandangos, mas este sujeito que troca as letras parece que só faz a barba uma vez por semana, deve ser para parecer que é um ganda machão. E também havia um com cara de bétinho com o cabelinho por cima das orelhas e que tem um nome estrangeiro, e eu começo a pensar que este partido (que não posso dizer o nome) tem dirigentes com tiques muito esquisitos, desde o gel no cabelo ao cabelinho a tapar a orelha. Mas o que é certo é que esta malta encheu o estacionamento de porches, audis, mercedes, jaguares e eu tive de trazer o meu fiat punto que ficou a destoar no meio deles. Eu, que sou uma profissional da vida muito discreta, tive que dar logo nas vistas desta maneira, parecia que estava no meio dos chulos lá do meu bairro. Mas veio o discurso do cabeça de gel, e até parecia aquele velhadas de cuba que nunca mais se cala, mas depois parecia aquele gajo da iurd a querer levantar o astral dos portugas, e depois já parecia o cigano da feira de carcavelos a querer impingir as calças levis fabricadas na china, e eu fiquei tão confusa que já não sabia quando bater as palmas e dar os tais gritinhos, de modo que baralhei o esquema de tal maneira que no final já estava toda a gente levantada a bater palmas, não sei se para mim se para o cabeça de gel, e eu fiquei tão envergonhada que me pirei dali para fora sem receber um chavo, meti-me no fiat punto, e fui direitinha para casa como uma menina bem comportada. Sei muito bem aquilo que sou, não o escondo de ninguém, mas ver tanto gajo com carros à chulo a bater palmas é que alguma coisa estava mal. Eu sou uma trabalhadora liberal, não tenho patrões, e conheço muitos dos tipos que estavam no tal congresso, alguns até são clientes meus (como pensam que eu fui contratada?), e muitos até pareciam estar a ter um orgasmo com o discurso, mas é muito mau para o negócio dar a sensação que não sei o que estou a fazer. Por isso baldei-me sem receber um tusto, mas quando algum destes espertos me cair na rifa vai ter de alargar os cordões à bolsa, olá se vai!

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