quarta-feira, dezembro 21, 2005

Natal...

Lembro-me que os natais da minha infância tinham a particularidade de me convencer do nascimento do menino todos os anos a 25 de Dezembro. Inocência a minha, que não me interrogava como é que um puto nascia ano após ano sem morrer primeiro. Recordo quando nas noites de 24 de Dezembro deixava o sapatinho na chaminé e no outro dia de manhã lá estavam a pistola de fulminantes, o carro de bombeiros, os cow-boys e os índios de plástico, que supostamente o recém-nascido menino Jesus deixava no sapatinho, alheio ao pivete que por vezes o objecto deitava. Mas os tempos agora são outros, e apesar do papá Bush cuspir ameaças a quem deseje as Boas Festas em vez de um Feliz Natal, o boneco gordo feito de colesterol e com cara de aguardente que dá pelo nome de pai Natal teima em resistir a mais esta intempérie. Tem piada, o país sem referências, governado por uma camarilha de judeus sem escrúpulos e texanos evangélicos e analfabetos, inventa o pai Natal, boneco destituído de qualquer parecença com o nascimento do Menino, e nem sequer levemente aparentado com a vaca ou o burro do presépio, e quer agora que o pessoal lá da terra troque o educado e universal desejo de Happy Holidays por Merry Christmas. Assim quase esqueço o menino Jesus da minha infância e não reprimo alguma solidariedade pelo palhaço vestido de vermelho. Mas o mais grave é que como os amerdicanos não fazem nada ao acaso, qualquer dia vamos ver o menino Jesus gordinho e anafado, a refastelar-se com um hamburger da McDonald´s, escorrendo gordura pelos beiços abaixo. E lá vai a imagem do pai Natal de coca-cola em punho ser proibida pela sua heresia, quiçá imolada pelo fogo sagrado da seita extremista que toma assento na Casa Branca. Já estou a ver as famílias portuguesas macaquinhas de imitação (pelo menos aquelas que mais ganham com a crise) a convencer o tio palerminha que se vestia de pai Natal a disfarçar-se de bébé com caracolinhos soltos e fraldinha dodot e a chuchar um hamburger para alegria dos filhotes candidatos a betinhos e a futuros lugares em conselhos de administração. Só por isto é que sinto alguma pena do pai Natal. Tivesse ele na mão uma cerveja Budweiser ou uma garrafa de Jack Daniels e a minha solidariedade seria incondicional.
Penso mesmo assim que o pai Natal vai resistir com coca-cola e tudo. O carácter universalista da beberragem está bem demonstrado pela sua penetração (leia-se fornicação) em todos os paises muçulmanos onde só se pode beber alcoól às escondidas. Quem é que no Iraque ou Afganistão iria emborcar uma Bud ou um trago de Bourbon às vistas do mulah ou, quem sabe, do próprio Bin Laden? Qual seria o bom muçulmano que se faria explodir junto a uma patrulha americana completamente emborrachado?
Se já lixaram o menino Jesus da minha infância, se querem lixar o pai Natal, se andam a lixar-nos a vida todos os dias com devaneios neo-liberais e fundamentalismo bacoco pseudo-religioso, então o melhor é passar a vida etilizado e beber mais um copo sempre que uma patrulha amerdicana vai aos anjinhos. E assim já não há Natal que resista. Definitivamente.
Um bom Carnaval para todos.

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