terça-feira, novembro 17, 2009

Nesta história de merda a única que se safa é a Scarlett, coitada



Estava eu a sonhar com uma orgia com a Scarlett Johansson quando a puta da campaínha da porta se lembrou de começar a tocar, o que me fez saltar da cama abruptamente sem saber se estava a dormir ou acordado. Vi logo que era o Elias, pois o estúpido só larga o botão quando lhe abrem a porta. O Elias era agora chefe das escutas, cargo a que chegou depois de frequentar as Novas Oportunidades e de pedir uma cunha ao padrinho que milita no partido e que só por acaso é juíz no Ministério Público.
- Que queres? Sabes o que perdi por tua causa? – perguntei eu entre o irritado e o ensonado.
- Tem de vir já, o chefe diz que é urgente. Parece que andaram a escutar o Filósofo sem ele dar autorização.
- Mas tu não és o responsável pelas escutas? – perguntei.
- Sou, quer dizer, não sou… sabe bem que só faço o que o chefe ordena, mas está bem, ele diz que o responsável agora sou eu.
Pouco inteligente, o Elias, mas enfim, com a falta de especialistas para o cargo só mesmo ele. O ultimo responsável das escutas apenas sabia falar tetum e era surdo que nem uma porta.

Passei o cabedal pelo duche frio, lambi uma torrada, dei leitinho ao tareco, liguei à mamã a dar-lhe os bons dias, e saí de casa mais o Elias atrelado a mim como um cão. Chegados à sede e depois das revistas da praxe, lá nos enfiámos como pudemos no gabinete do chefe, os três mais o hipopótamo, a mascote da agência, que se entretinha a roer um molho de cenouras enquanto dava uma vista de olhos pelos jornais do dia.

- Temos crise da grossa! – disse o chefe. – Alguém vai ter de descalçar esta bota. – e olhou de soslaio para o Elias, e de frente para mim.
- Ferdinando, o que sabes tu de escutas? – perguntou.
- Bem, chefe – respondi – para lhe ser franco sei tanto de escutas como de algebra linear.
O homem arqueou uma sobrancelha.
- O Filósofo pede resolução imediata do problema. Já sabem que se a coisa estourar são os vossos empregos que estão em perigo. Eu já tenho um lugar prometido numa empresa pública.

Não foi preciso dizer mais nada. Arrastei o Elias dali para fora que já começara com as lamentações e a arrepelar os cabelos, preguei-lhe dois tabefes para acalmar e fomos discutir o assunto para o Boca na Botija.

Ao fim de meia dúzia de imperiais já o homem parecia mais alegre, apesar do hipopótamo que nos seguira desde o gabinete do chefe e que se sentara duas mesas mais atrás procurando passar despercebido.

Enquanto o Elias me contava as desventuras da irmã que fora recentemente internada num hospício após ouvir o último disco do José Cid, eu traçava mentalmente um plano para resolver a situação.

Duas semanas mais tarde, estava eu a banhos numa ilha perdida do Pacífico, quando o Elias telefonou.
- Sabe, parece que substituiram as gravações das escutas por um concerto do Paulo Gonzo ao vivo. Já pode regressar a casa, o Filósofo está safo.

Não sei se voltarei. Depois de ter enviado pelos ares o edifício da Telecom e enterrado a barragem de Castelo de Bode não creio que a minha popularidade esteja em alta. E pelo menos aqui posso sonhar à vontade com a Scarlett Johansson sem ter o Elias, o chefe ou o Filósofo a chatear.

Só não me consegui livrar ainda do hipopótamo. O cabrão tem-me seguido por todo o mundo e às vezes mesmo que não o veja, sinto os seus olhos maldosos cravados na minha nuca. Se a besta tivesse tentáculos diria que o polvo já se expandira irremediávelmente por toda a parte.

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