quarta-feira, dezembro 05, 2007

A Inversão do Papel do Estado

Com as desculpas antecipadas ao Timoneiro e ao Ukabdsinais por ser eu a publicar aqui o que me enviaram, aqui vai:
DN 03/12/07
A INVERSÃO DO PAPEL DO ESTADOJoão César das Neves, professor universitário
O futuro terá muita dificuldade em entender a nossa obsessão com o Estado. Esta é a época que mais teoriza sobre o papel das autoridades, onde os poderes públicos mais se esforçam por melhorar a vida dos cidadãos, mas onde existe a maior confusão, atropelo e ambiguidade nesses mesmos poderes. O Estado não faz o que deve e anda a meter-se onde não é chamado. Assistimos nos últimos tempos a um recuo evidente do Governo nas suas funções básicas. Ao mesmo tempo há funcionários, fiscais e técnicos a invadir a intimidade dos cidadãos em nome da segurança e bem-estar. Se isto continua em breve teremos uma inversão total da estrutura institucional.O mais surpreendente é que muitas mudanças básicas acontecem, não por razões ideológicas, de forma planeada ou segundo análises fundamentadas, mas por mero deslize. São consequências laterais de tácticas oportunistas, expedientes patetas ou golpes de conveniência. A tacanhez política está a ter efeitos radicais que dificilmente serão corrigidos.O recuo do Estado nas suas funções próprias é bastante evidente. Desesperado pelo défice, o Governo perde de vista o seu papel. A fúria de privatização há muito deixou de ter propósitos estruturais, para se tornar mero instrumento financeiro. Privatiza-se não o que se deve, mas o que rende. Como as corporações capturaram as funções que deveriam exercer, cada ministério trata mais de reivindicações de profissionais que do seu serviço ao povo.Um recente caso escandaloso é o das Estradas de Portugal. Entregou-se a uma sociedade anónima uma função essencial do Estado, a liberdade de circulação, pois estradas abertas constituem um direito fundamental de cidadania. Qual a razão? A bomba de relógio financeira das SCUT, criada na ilusão de obter dinheiro privado para infra-estruturas, está a explodir. Por isso entrou-se numa fuga para a frente, generalizando a abordagem. Quando o primeiro-ministro afirmou em 16 de Novembro que a nova empresa tem por objectivo a "sustentabilidade financeira", ele sabe que isso só será possível com uma qualquer forma sofisticada dos antigos bandoleiros dos atalhos.Enquanto aliena funções fundamentais, a sempre crescente máquina estatal atarefa-se a tratar da violência doméstica, inovação tecnológica, galheteiros nos restaurantes, embalagens de brinquedos. Proíbe o fumo, o ruído e o excesso de velocidade, promove o aborto e facilita o divórcio. Dizemos ser um país livre, mas é impossível a matança do porco, brindes no bolo-rei, ou termómetros de mercúrio.Tudo isto no meio de uma fúria legislativa, onde novas versões de diplomas surgem antes de secar a tinta nas anteriores. Um exemplo sugestivo, já que se fala de trânsito, é o Código da Estrada. O Estado, que se demite da gestão rodoviária, está cada vez mais enfiado com o condutor ao volante. Como andar de automóvel não muda há décadas, seria de esperar estabilidade nessa legislação fundamental que afecta toda a população. Pelo contrário, esse campo é um emaranhado de diplomas.Referindo apenas os principais, tínhamos um código, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, que foi depois revisto e republicado pelos DL 2/98, de 3/1, e 265-A/ 2001, de 28/9, e alterado pela Lei 20/2002, de 21/8. Então o Governo decidiu criar um novo Código, que aprovou pelo DL 44/2005, de 23/02. Desde então, nestes dois anos já foram publicados 26 novos diplomas que o complementam, corrigem e acrescentam. São quatro leis, cinco decretos-leis, dois decretos regulamentares, seis portarias e nove despachos. O site da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, na secção Trânsito, tem um total de 46 diplomas que devemos conhecer cada vez que entramos num carro.O mais incrível é que os responsáveis não se dão conta de que esta profusão legislativa apenas manifesta a sua tolice, impotência e incapacidade. O Estado tornou-se uma galinha tonta, a correr em todos os sentidos. As gerações futuras vão divertir-se com este tempo infantil que acha que a lei resolve tudo mas não consegue decidir qual lei o deve fazer.

Resposta do Ukabdsinais:
Não posso deixar de dizer isto:

Este senhor César das Neves é um dos mais acérrimos fundamentalistas católicos que existem nesta merda de país. No referendo ao aborto deu a cara pelo não com
argumentos tais como genocídio de criancinhas, quem abortar vai para o inferno e coisas assim. Além disso pertenceu a um dos governos do Cavaco.
Não sei nem me interessa se esta alimária é ou não um reputado economista ou se tem ou não razão, neste caso, naquilo que escreve. Se calhar até tem.
Mas não consigo evitar enviar este aborto para a puta que o pariu mais o caralho que o foda.

Pronto, já disse.

E a minha verborreia:
Além de subscrever totalmente as palavras do Ukabdsinais, atrevo-me a dizer mais:

Na história muito recente deste povo que habita o planeta Terra, talvez não mais de há 50 anos para cá, o que alguns pensadores mais esclarecidos já tinham avisado antecipadamente está a acontecer a olhos vistos. Trata-se da apropriação das mentalidades por parte dos poderes internacionais, quer sejam financeiros, económicos ou políticos. Apropriação esta que, sendo subtil, inteligente, focando a sua matriz no mais humano dos sentimentos de querer o dia de amanhã melhor do que hoje, de forma concertada e organizada criam o desejo de consumir o inútil e desnecessário como um meio de vida, como um objectivo individual de satisfação virtual no caminho da almejada felicidade.
A pessoa deixou de ser humana, com diferentes formas de estar e escolhas diversas, para passar a ser um objecto puro do consumo, de viver em função das poderosas máquinas de marketing publicitário, não lhe podendo escapar a não ser que se assuma como marginal, como minoritário, como permanente lutador contra esses poderes instituídos, onde a regulação e as normas se impõem fortes, indestrutíveis perante o binómio custo/benefício.
Apenas alguns, poucos no meio dos mais de 6 biliões de seres vivos dos quais apenas 2 biliões vivem com mais de 2 dolares por dia, têm capacidade para compreender o que se passa, pois os acontecimentos e as trapaceiras são mais velozes do que o tempo necessário para entendê-las, daí a mais simples das formas encontradas pela maioria de se submeter, sem apelo nem agravo, à apatia, ao não vale a pena individual, ao encolher de ombros. Antigamente esta função, ao nível das mentes, era similarmente efectuada pelas religiões no mundo, embora ainda hajam vários cantos do mundo onde tal acontece. Actualmente, neste tempo moderno, os deuses passaram a ser os donos financeiros e económicos. Nos países ditos mais evoluídos, o deus passou a ser o poderoso humano que tem rosto, a religião passou a ser o mercado do consumo e a água benta tem o nome de dinheiro.
E nascem como tordos os arautos destes atributos, a quem lhes dão o acesso aos meios de comunicação para espalharem a sua fé, a maior parte das vezes de uma forma subtil, encapotada, até dando uma ideia de que são muito humanos e só querem o bem comum, utilizando toda a sua mente prevertida para, ora apregoando uma coisa ora bradando o inverso uns tempos mais tarde, confundir a maioria pouco esclarecida que, na sua pobre inteligência de pão-de-ló, se deixa embalar na cantiga do bandido.
É o caso, de entre muitos que por aí há, deste tal badamerda César das Neves, cujo passado de vida é suficiente para que não lhe possamos dar a mínima oportunidade de estar de acordo com ele, nem que ele afirme que a terra é redonda, o dia tem 24 horas, 2 mais 2 são 4 ou a Fabiana faz o melhor broche do mundo!
Qualquer verdade vinda de malandros assim é pura especulação demagógica. E até são professores!!!

Agradeço ao Timoneiro a atenção prestada por enviar o texto e ao Ukabdsinais por me ter espicaçado as entranhas para esta breve reflexão que convosco quero partilhar.

2º remador

Nota: Sugiro aos meus amigos a leitura do livro saído este ano do Fernando Pereira Marques, "Esboço de um programa para os trabalhos das novas gerações", título que o autor foi retirar a uma obra do Antero de Quental.

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