quinta-feira, dezembro 02, 2004

Enchi o Saco!

Enquanto o parlamentar Silva discursava disparando insultos e gafanhotos por todo o hemiciclo, o parlamentar Costa dormitava e sonhava com havaianas nuas a dançar ao som do ukelele, o parlamentar Sousa tirava com precisão a cera dos ouvidos com o saca-rolhas, o parlamentar Santos coleccionava burriés na base do microfone, a disponente Mafalda fazia a pedicure ao adjunto, e o presidente engolia sapos vivos que retirava de um balde a seus pés, eu tratava de tentar encher o saco, tarefa que completei ao cabo de 3 meses sem comer nem dormir, nem sequer ir a casa pôr o rinoceronte a fazer as necessidades, sei lá o estado de sítio em que tudo aquilo estaria.
Fechei o saco com a guita que o consul de Myanmar me presenteara pelos serviços prestados, e corri ao mcdonald´s mais próximo a fim de matar a fome e a sede.
Tive azar.
Era dia de macrobiótica e os bushinhos de plástico estavam esgotados, pelo que tive de optar pela cantina do parlamento, onde o manjar não vai além de postas de peixe-espada e dos arrotos da praxe. Já ia na oitava posta quando o Elias me ligou esbaforido a exigir que viesse logo, pois o 1º ministro caira da incubadora e fracturara o externo. Engoli o que restava do peixe-espada com espinhas e tudo, emborquei o que restava do último bidon de cerveja, arrotei com estrondo e corri da cantina para fora esmagando o crânio ao chefe Lemos que procurava o cromo do Figo debaixo da mesa. Apanhei o saco no caminho e entrei no gabinete do Elias sem bater no porteiro que ficou a olhar para mim suplicante.
Já lá estavam todos: o Teles da mercearia, o construtor, a carpideira, o Aníbal, o intelectual e o apanha-bolas. Onde está o 1º ministro? Perguntei espirrando suor, baba e espuma de cerveja por todos os lados. O Elias olhou para mim com ar reprovador e a carpideira parou de carpir.
Que andaste a fazer até agora? Temos de tomar já uma decisão urgente e tu a encher o saco num canto qualquer sem dar cavaco! Temos de descartar responsabilidades deste caso!
O Teles da mercearia pôs o dedo no ar a medo: Podíamos dizer que o externo já vinha partido da fábrica... O Elias praguejou (em inglês, diga-se) e deu um murro com tal força na secretária que esta saiu dali a ganir. É sempre assim quando se irrita.
Incompetentes! Estou rodeado de incompetentes! Gritou ele acordando o ministro da Abundância que ainda não sabia se existia. E saiu porta fora deixando-nos a todos parados e ambasbacados a olhar uns para os outros. É claro que o ministro aproveitou e pediu logo ali a demissão, enquanto o Teles olhava para o próprio dedo com ar de desconfiado. O Aníbal ainda tentou dizer qualquer coisa, mas a carpideira começou de novo a chorar. O construtor e o intectual saíram de mão de dada, e eu pensei para comigo que o apanha-bolas até nem era um mau bode expiatório. Mas tive pena dele, o gajo não merecia. Assim, peguei no saco e empurrei o apanha-bolas porta fora, a carpideira que se lixasse.
Desta vez não me esqueci de bater no porteiro que me agradeceu a escorrer sangue, e todos os três, eu, saco e apanha-bolas lá fomos à tasca mais próxima comemorar.
Não é todos dias que um 1º ministro cai da incubadora.
Bebemos uns copos, fizemos umas saúdes, e no final já bem bebidos cantámos o hino nacional. De volta ao parlamento esvaziei o saco na escadaria principal e pela primeira vez em quase 3 meses senti-me quase feliz.

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